As orquestras têm um papel importante e exclusivo no universo das músicas de carnaval, sejam em ambiente fechado, onde prevalecem as orquestras com acompanhamento harmônico e bateria conjugada, sejam no ambiente das ruas, onde ganham destaque as orquestras de sopro, ou bandas de música.
Até o início dos anos 1970 as orquestras ilustravam os mais significativos eventos do Carnaval , não só na Bahia, mas principalmente no Rio de Janeiro, de onde os bailes espalhavam por todo o Brasil as novas marchinhas, em cujas letras se criticava com muito humor fatos da vida política e social do país. Mas as orquestras da Bahia tinham a virtude de estrear e emplacar nacionalmente muitas músicas de sucesso, principalmente sambas. Sou jovem há muito tempo, por isso ainda me lembro de ter assistido, mãos dadas com o meu pai, a um desfile onde a miss universo Martha Vasconcelos desfilava em carro aberto, pela Avenida Sete, enquanto uma orquestra plantada em outro carro tocava obstinadamente El Cubanchero, uma rumba.
No final dos anos 1980 a prefeitura de Salvador instituiu um concurso de orquestras, como forma de incentivar o estilo, bastante abalado com o advento da guitarra elétrica. A essa altura a minha jovem orquestra venceu todos esses concursos, enquanto houve, garantindo seu lugar no Palco das Orquestras, montado na Praça Municipal. Quando Osmar passava diante desse palco, havia um diálogo. O trio elétrico tocava pasodobles, e eu respondia com frevos de Dodô e Osmar, arranjados para orquestra.
Quando se reformou o Pelourinho abriu-se um espaço admirável onde os bailes de salão continuam a atrair, todos os anos, praças lotadas. Mas é um espaço que vem sendo reduzido, a cada carnaval, a favor de grupos comprometidos com temas identitários ou étnicos, ou pontuais. Houve espaço para certo modelo de orquestras até no grande palco da ladeira, mas não grupos como os nossos, são orquestras temáticas. A minha orquestra tem o mérito de ser a primeira a tocar, em arranjos exclusivos, músicas da jovem Axé-music, mas sempre a serviço do gosto popular, sempre dando suporte à confraternização das pessoas. O que define a orquestra brasileira de salão não é só o instrumental mas a capacidade de prestar esse serviço musical à comunidade. No Carnaval, tocamos música carnavalesca; no são João tocamos música joanina e no Natal, aquelas melodias de shopping. Vivemos para um público que existe, inclusive renovado de muitos jovens e crianças, e que precisa de um espaço para ouvir-nos.
Para 2014, o Palco das Orquestras da Praça Municipal foi desativado e não nos ofereceram alternativa. Nesse sentido eu e os outros mestres de orquestra comprometidos há muitos anos com o Carnaval da Bahia sugerimos que se coloque o Palco das Orquestras no bairro do Santo Antônio, onde um recente festival de samba deu também um show de civilidade e convivência fraterna. Perguntemos ao morador se ele não ficaria feliz tendo lá orquestras. Esse palco poderia se chamar Espaço Cacáu do Pandeiro, uma justíssima e oportuna homenagem a esse Tata Madiba das Orquestras, que já está bem idoso, à frente da sua Orquestra Yemanjá. A cidade vibra com um recente concurso de marchinhas instituído pelo bloco Os mascarados e pela Secretaria de Educação do Estado: e qual o destino de quem vem mantendo essas marchinhas no Carnaval?
Colocaríamos lá a Orquestra Fred Dantas, Orquestra Yemanjá, Orquestra Reginaldo de Xangô, Orquestra Cuba Jazz, Os Turunas, Oficina de Frevo e Dobrados, Orquestra Paulo Primmo, Orquestra Benutti e Zeca Freitas. Só gostaríamos de não incluir as orquestras sinfônicas e temáticas (dedicadas a um repertório específico), que apresentam um trabalho próprio, já têm conseguido financiamento diferenciado e dificilmente tocariam Ala La ô para as pessoas.
O Espaço Cacáu do Pandeiro, no Santo Antônio, tem possibilidade de ser um recanto seguro para famílias com crianças, gringos dos numerosos hotéis e pousadas da área, um público folião de samba e marcha, mascarados, enfim, gente que gosta do que fazemos e que ano passado sentiu muita falta das orquestras e grandes bandas de rua no Pelourinho. E que já sugere outro espaço, pois o Pelourinho vem sendo muito disputado, caracterizado como espaço afro-lúdico.
Ou esta ou outra solução, o que não pode ser é ver as orquestras simplesmente fora do carnaval por não ter representantes lá, pressionando a Coordenação do Carnaval. Temos público, tradicional e jovem, temos centenas de pais de família dependendo desse cachê e temos uma missão artística a desempenhar
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