01/04/2010

Fotografia de Ivã Coelho


Ivã Coelho: Fotógrafo e advogado pós-graduando em Ciências Criminais. Ganhador, em 2009, do III Salão do Mar (concurso anual promovido pela Marinha) e um dos selecionados no concurso-catálogo-exposição África em Nós (concurso promovido pela prefeitura de São Paulo com curadoria do fotógrafo Walter Firmo).


Como é a sua arte, como você começou a se interessar pela fotografia?

Fotografia é um alumbramento de criança, quando ganhei de um tio caminhoneiro uma pequena máquina Love. Era uma máquina descartável dos anos 80, fazia as fotos com ela e deixava-a para revelar no laboratório a máquina inteira, que não retornava. Teve uma época que tinha uma promoção que o fotógrafo levava a Love, deixava pra revelar e ganhava outra juntamente com as fotos reveladas no papel, então havia um ciclo que só terminava se você quisesse interromper.



Era um brinquedo curioso. Ficava intrigado com o processo de fotografar, não entendia, mas era divertido. Eu mesmo menino era o responsável pela fotos dos feriados com a família na Ilha de Itaparica. Eu só não gostava de aparecer nas fotos. Havia algo de estranho com a minha imagem, eu nunca me reconhecia nela. Desenvolvi quase uma fobia. Não queria aparecer em fotos de jeito algum, mas adorava estar por trás da câmera, operando e desvelando o que via. Essas fotografia espalharam-se pela família e foram perdidas ao longo desses anos.

O tempo passou e na adolescência minha mãe deu-me de presente uma Zenit 122 para que eu fosse ganhar dinheiro, mas eu não conseguia me ver, do alto da minha timidez, fazendo fotos em casamentos e aniversários. Então fiquei só nos estudos técnicos e quando sobrava algum dinheiro da mesada pra comprar filme e revelar eu fotografava. Como outras coisas chamaram mais minha atenção na época dos 18 anos (o rock) eu deixei a máquina de lado, perdida no fundo do guarda roupas. Durante todos os meus 20 e poucos anos a fotografia para mim se resumiu ao trabalho de outros. Comprava revistas, ia a exposições (descobri o trabalho do Robert Mapplethorpe no MAM de São Paulo e fiquei fascinado por seu trabalho) e só.

Com a fotografia digital, há um ano comprei uma câmera digital Nikon e desde então venho reaprendendo a fotografar a cada clique, a cada edição das fotos, em livros de técnica, estudos filosóficos e antropológicos e em todos os papos com outros fotógrafos e na web em fóruns, blogs e no Flickr.




Quais seus projetos? Seus planos pro futuro?

Continuar o aprimoramento na arte fotográfica, dedicando-me mais a trabalhos documentais com pretensões de participar de salões de arte e de estar no movimento de desvelar o mundo através das lentes fotográficas, tentando inserir a fotografia como instrumento de mudança social. É um caminho tortuoso, como relata-me fotógrafos que estão há tempos nele, mas que considero de grande valia e desmesurado contentamento, já que estarei fazendo algo que considero importante. Tudo isso são planos, vontade em potência. Essas imagens ainda estão por se materializar.

Qual a sua relação com a fotografia, e o que você prefere ao tirar suas fotos?

Meu interesse por fotografia tem grande concentração na vertente dos ensaios autorais, gosto da fotografia como forma de expressão no mundo, como forma de expressão pessoal, enquanto meio para mostrar o homem em todas as questões que lhes são caras. Gosto de fotografar gente, seus medos, alegrias, suas vastas emoções e pensamentos imperfeitos. É um pouco do que tento fazer quando escrevo contos e poesias, buscando usar cada palavra como ferramenta de expressão, como construtoras de imagens. Na fotografia a escrita é com a luz, mas o intento é o mesmo.

Você acha que Salvador é uma boa cidade para realizar suas fotografias e por quê?

Salvador é uma cidade privilegiada pela luz e por temas diversos para serem abordados de maneiras também diversas. Claro que há uma tendência forte a buscar imagens nos temas religiosos, na temática da herança afro descendente, na voluptuosidade da força negra, muitos foram os fotógrafos mestres que se dedicaram a estes temas que até hoje toca, encanta e são ricos em possibilidades imagéticas, mas há outros temas igualmente representativos da cultura baiana que podem ainda ser explorados e viabilizados. Fotografia depende muito da criatividade, um fotógrafo de olhar esmerado e grande sensibilidade pode tirar leite de pedra e conseguir imagens de valor de coisas banais para muitos.

O que dificulta o fazer fotográfico em Salvador é a falta de educação visual da população como um todo, da pouca importância que se dá a essa arte ainda. Faltam cursos para aprimoramento, falta espaço para exposições.

Temos uma boa cena de fotografia, com importantes festivais anuais, galeria especializada, cursos esporádicos etc., mas falta difusão disso, falta abertura para que cada vez mais o cenário cresça e atinja relevância nacional e internacional.

Temos excelentes expoentes da fotografia enquanto arte. O trabalho de Mario Cravo Neto, do Voltaire Fraga, do Cristian Cravo, do Marcelo Reis dentre tantos outros são trabalhos importantíssimos que ratificam a existência dessa força criativa dentro da fotografia baiana, mas, mesmo pra eles, falta mais divulgação dentro da cidade, para um público maior, menos elitista. Por isso a difusão é importante, assim como a educação das pessoas, mesmo as menos interessadas em fotografia como expressão artística, documental, histórica. Falta valorizar o já produzido e fomentar a produção contemporânea.

Como é a sua relação com as pessoas que você se inspira ? O q você mais gosta de fazer dentro da sua arte?

As relações são diversas, vai desde a abordagem amistosa ao interpelar desconhecidos na rua, na feira ou nas festas populares até a relações mais íntimas com amigos, amores e outros do meu rol de conhecidos. Então tem desde imagens de pessoas na rua em seus instantes decisivos até a imagens mais intimistas/subjetivas com pessoas com as quais convivo. E o meu desejo é variado, tenho prazer em documentar uma expressão da cultura popular tanto quanto pensar em imagens e criar personas para amigos posarem para mim. Somos múltiplos e, embora a sociedade exija de todos (mesmo dos artistas) uma especialização, creio que ainda é possível transitar em diversas nuances sem perder o viço.



Existe outro lugar em que você se sentiria bem em fazer sua arte?

Com criatividade e empenho é possível fotografar em qualquer lugar. O que acharia interessante é se estivesse numa cidade com mais possibilidades de divulgação, de aprimoramento, de troca, um lugar que vivesse mais a fotografia, das suas abordagens comerciais às artísticas/autorais. Salvador está no caminho para se tornar uma cidade mais movimentada nesse sentido, para o mundo fotográfico. Estar num centro mais movimentado ajuda, incentiva e possibilita uma troca grande, um compartir que auxilia no crescimento, mas hoje temos informação fácil e farta e por aqui tem muita gente empenhada no ato fotográfico, de profissionais a amadores (iniciantes, avançados, entusiastas etc.) e isso dá uma perspectiva mais ampla, um desdobra mais efetivo. É o que os apaixonados pela arte fotográfica querem.

http://www.flickr.com/photos/24038199@N03/


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Por Estéfano Díaz
estefanodiaz@salvadorupdate.com

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